Resenha: Os
Despossuídos: debates sobre a lei referente ao furto de madeira, de Karl Marx (Ed. Boitempo, 2017).
Por: Caetano Lagrasta Neto.
Sou eu, perdoem-me; sou eu, Karl Marx.
Acredito que não será
nem o primeiro e nem o último de meus esvoaçantes retornos a este país e seu
Continente. Enquanto vagueio de um lado a outro, muito à miúde, me pego com
ganas de promover uma verdadeira Revolução e sempre a perder o pelo, mas, o vício
cresce.
Tentamos nos sertões,
com Conselheiro; Prestes, Gregório Bezerra e Marighela; Gramsci o fez com
Leandro Konder ou Carlos Nelson Coutinho; acredito que nestas andanças cruzei
com Rosa Luxemburgo, o que não faz muito tempo, mas em todas não foram
ultrapassados medíocres ensaios.
Outro dia, num desses
maravilhosos desvãos em que se metem os mortos, caiu-me às mãos, três antigos
escritos que enviei para a Gazeta Renana, lá pelos idos de 1840 (aqui publicados
sob sugestivo título: “os despossuídos”, pela editora Boitempo) onde escrevia
eu, sob os ardores da juventude, sobre a lei do furto de madeira.
Num país como este,
pus-me logo a pensar, a madeira, as terras da Amazônia e de outros Estados bem
grandes, os aborígenes etc, forneceriam uma temática – ainda que requentada –
útil, ao desencadear de algum espasmo.
Os ingredientes, com
algumas alterações, estavam postos: um congresso eleito, (coisa que lutei para
conseguir através do voto universal, direto e secreto, ainda que antecipando
dificuldades através da facilitação ao capital de eleições dirigidas e muito
bem sustentadas, a congressistas corruptos e dependentes).
Por sua vez, a madeira
e a terra, além daquelas demarcadas para os índios é outra questão enfrentada
sob os auspícios de um neoliberalismo atroz.
A lei aqui, fiquei
pasmo, é a própria Constituição – diariamente menosprezada, rasgada e usada até
para fins menos nobres, por políticos e seus partidos, juízes, economistas, industriais
e tudo o mais que se preste a cegamente servir aos interesses do capitalismo
mais selvagem que gravita eterno neste Continente.
Pois bem, temos a lei
que é interpretada no sentido de nunca alcançar o furto (seria melhor dizer
roubo, ou mesmo latrocínio, tendo em vista as violências e mortes praticadas
contra os proprietários indígenas ou o bem público), detidos alguns peões escapando-se
madeireiras e seus proprietários a uma verdadeira perseguição pela polícia da
federação ou dos estados e à prisão, quando existem indícios veementes de chacina
ou morte de lideranças, que na Renânia daqueles idos como aqui, nos de hoje,
pode-se novamente concluir: “... o Estado
se comporta como um vulgar segurador dos proprietários”.
Por sua vez, a
propriedade demarcada é sumariamente espoliada e roubada aos legítimos donos
que, diante da posição de vulnerabilidade não conseguem contrapor sequer o direito de viver, superior aos tais
direitos humanos que o sucedem (liberdade, felicidade etc).
Desta forma, os
capitalistas donos das serrarias (facilmente localizáveis por intermédio de objetos
voadores não pilotados e satélites) continuam vivendo à rédea solta, deixando
que se mostrem apreensões para justificar os salários dos policiais e o
movimento do judiciário, prestando-se o sistema de governo não para garantir a todos
os cidadãos proteção ou que usufruam da exploração da madeira de forma a não
consumar – desde os tempos da descoberta – o mais sórdido extrativismo.
Quanto às terras,
garantidas à sobrevivência indígena, ora, ora, o que o Estado garante mesmo é a
exploração fundiária e o agronegócio, pois parece elementar que dar terra e não
providenciar o escoamento da produção ou – aqui, sim, ao argumento de se evitar
o contato desagregador à cultura indígena – não fornecer maquinário adequado
para uma correta sobrevivência. Mas, nada acontece ao ladrão ou usurpador,
enquanto as demarcações aguardam nos fóruns e tribunais por uma decisão
definitiva – ainda que seja para ser desrespeitada.
Há que se pensar, como
àquela época que ao direito de viver se sobrepôs o direito de propriedade, mas
é evidente – ao menos para mim – que ambos ao visar o bem-estar e a felicidade
do ser humano, se igualam e não pude deixar de continuar pensando, como o fiz
n’ O Capital:
“Entre direitos iguais, quem decide é a força”.
CAETANO LAGRASTA NETO é jornalista, juiz, escritor; colunista da Revista Plural, colaborador do Tempestade Urbana, advogado, mediador e árbitro das Câmaras da CIESP/FIESP e CAMITAL.
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